online. Grata pela visita e leitura da minha prosa. Sonia Regina. prosa, somente prosa



No soar da gaita





Ouvira-se ao longe a melodia, quando a bomba explodiu e os destroços o rodearam como um roçar de planetas, causando horror e devastação.

Era final de tarde e Rodrigo voltava ao abismo, para tentar atravessá-lo. Do outro lado a gaita ecoava como um prenúncio. Escutou atentamente dessa vez, com o espírito e o corpo.


Conforme os presságios, haveria um ponto no tempo em que ele se desembrulharia da acuidade de algumas transparências excessivas. Chegara a hora de cultivar o oculto e criar um foro íntimo e secreto, só seu.


Sacudiu o manual para ver se caíam instruções de como fechar o precipício. Ledo engano lhe causava a imaginação: nada aconteceu. A boca seca o remetia aos saltos do coração e somente a memória vazava, trazendo-lhe a lembrança do dia em que o abrira.


Uma busca infrutífera o levara àquele momento do passado. Procura fadada ao fracasso, embora tudo estivesse ao seu alcance. Teria bastado mirar-se – isento - com atenção plena. Veria mais que reflexos.


Então, aconteceu-lhe um sorriso. Percebeu que já não sentia o frio insuportável nos ossos, acirrando-lhe o desânimo. Levantou-se e seguiu pedalando no soar da gaita, em direção ao sol.


Foi pelo caminho do meio - sem despenhadeiros, abertos ou fechados. Haviam sido, na verdade, trincheiras. Desnecessárias, agora: não havia com quem guerrear.



Sonia Regina








 

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©2010 Sonia Regina