Aparentemente
tudo fluía e funcionava. A cadela a seus pés realizava o que havia de
fidelidade e entrega incondicionais. O céu azul e os sons do domingo sobrepunham-se
levemente. Das vielas os risos e saudações diziam do prazer do encontro e uma
ou outra tosse não o turvava.
Núbia, contudo, sentia-se embaçada. Como um espelho no vapor d´água pouco mostrava de seu brilho e o cotidiano a incomodava em sua secura.
Ocupava o horizonte. Soltara-se das raízes já havia alguns anos e voar era impossível. Metáfora antiga e empoeirada, as asas mantinham-se fechadas e rentes ao corpo. Núbia não tentava alçar voos e o consentimento das asas a comovia.
Sorriu, ao constatar o quanto precisava de novas raízes, alguma rotina e lençóis de algodão. Aqueles de seda, belos e caríssimos, potencializavam sua sede. Tinha uma paixão acesa e seca.
Núbia não se refugiava no que vivera. O passado não adentrava
o presente senão para desdobrar-se em efeitos que iluminavam sua vontade.
Aprumou-se
quando a vizinha a chamou do portão. Atendeu-a, deu-lhe a xícara de açúcar e um
sorriso.
***
À porta
entreaberta rangia o dia. Aquele coração que acordara solitário e sem sonhos rendeu-se
à marcha natural das coisas. Nela, a existência da grande força que tudo
comanda...
Sonia Regina
30.6.12